Cristais e vidros
Embora
o termo cristal tenha um significado preciso no âmbito da ciência dos
materiais e da física do estado sólido, em linguagem coloquial o termo
é utilizado de forma muito abrangente para designar objectos sólidos
que apresentam características de brilho e forma bem marcados, em geral
associados a formas geométricas simples. Se alguns são cristais, como o
gelo, a neve e o sal de cozinha, outros são na realidade vítreos, isto
é são compostos por materiais cujos átomos não apresentam qualquer
ordenação especifica. Apesar de em geral o arrefecimento de uma
substância conduzir à formação de cristais (isto é à cristalização),
tal não é uma verdade universal. Misturas de substâncias muito
heterogéneas raramente cristalizam e em alguns casos o arrefecimento
pode ser tão rápido que as moléculas ou átomos perdem mobilidade antes
de poderem atingir a posição correcta na malha cristalina.
Um
material não cristalino, como o vulgar vidro, não apresenta ordenação
espacial dos seus átomos ou moléculas ao longo de distâncias
consideráveis, face ao raio desses átomos ou moléculas, pelo que é
denominado amorfo ou vítreo. Estes materiais são em geral denominados
sólidos amorfos, sendo um exemplo geológico conhecido a obsidiana.
Na
linguagem corrente e no comércio, a palavra cristal é utilizada para
designar vidros de elevada transparência e qualidade, genericamente
comercializados como cristais. Estes cristais de vidro não são mais do
que vidro com um elevado teor de óxido de chumbo, os quais, como vidros
que são, não têm estrutura cristalina, já que neles os átomos não
apresentam qualquer forma de arranjo regular. Tais vidros, apesar de
denomiandos cristais, não podem de forma alguma ser considerados um
cristal no sentido utilizado no presente texto.
Estrutura e formação dos cristais
Num
cristal a posição de cada um dos átomos, moléculas ou iões que o
constituem, que para economia discursiva passaremos a designar (de
forma menos correcta) por partículas, é determinada pelas posições
ocupadas já existentes. Assim, no momento de cristalização, a partícula
forma com as suas vizinhas um conjunto de ligações químicas (de
qualquer tipo, indo das iónicas às ligações fracas) que determina a
posição espacial que tenderá a ocupar.
Em resultado desse
processo, forma-se uma estrutura tridimensional, mantida de forma mais
ou menos rígida pelas ligações entre partículas, que se vai
progressivamente propagando no espaço, formado assim um sólido que
tenderá, pela expressão macroscópica desta ordenação interna, a ter uma
forte tendência para a simetria.
São esses os sólidos a que
chamamos cristais. As estruturas cristalinas ocorrem em todos os tipos
de materiais com todo o tipo de ligações inter-moleculares e
inter-atómicas. Quase todos as ligações metálicas por nuvem de
electrões coexistem com um estado policristalino, já que os metais em
estado amorfo ou monocristalino raramente existem na natureza. A
generalidade dos sais cristaliza, já que as ligações iónicas, formadas
a partir da condensação de soluções, ou da solidificação de sais em
fusão, formam malhas cristalinas muito estáveis. Daí que quase todos os
sais em estado sólido sejam cristais. As ligações covalentes também são
muito comuns em cristais, em particular em cristais orgânicos (como os
açucares e as proteínas puras). Outro exemplo de cristais com ligações
covalentes são o diamante e a grafite.
Os polímeros em geral
apresentam regiões cristalinas, mas o comprimento das cadeias dificulta
a cristalização total. Para além as ligações atrás referidas, as forças
de van der Waals assumem um importante papel na formação dos cristais,
controlando a aproximação das moléculas e mantendo-as nos seus mínimos
de enenergéticos. Em geral, os cristais formam-se a partir de
substâncias fluidas à medida que estas vão sofrendo solidificação ou
precipitação (caso se trate de uma solução). A forma mais comum de
cristalização consiste na existência de uma solução, a partir da qual o
material que forma o cristal vai precipitando e, no processo, cada
átomo ou molécula vai assumindo uma posição que é determinada pelos
átomos ou moléculas vizinhas. O
Gálio é um metal que forma
grandes cristais. A arrumação das partículas, e a sua persistência no
lugar que ocupam na malha cristalina, é determinada pelo existência de
um mínimo energético nessa posição, correspondente à optimização das
ligações formadas entre as partículas. Um exemplo típico deste processo
é a formação de gelo: quando o movimento browniano induzido pela calor
é suficientemente pequeno para permitir que as moléculas de água se
liguem de forma estável (em água pura aos 0º C), as ligações entre as
zonas de polarização eléctrica positiva e negativa das moléculas são
imobilizadas por ligações de van der Waals (assim denominadas em
homenagem a Johannes Diderik van der Waals), as quais as mantêm em
posição.
Em resultado, as moléculas da água vão sendo
progressivamente presas na estrutura, formando-se o gelo. Devido à
formação desta rede, e à redução de entropia que corresponde à
ordenação das moléculas, o gelo tem uma energia interna inferior à da
água, daí que seja necessário fornecer um calor de fusão (igual àquele
que ele liberta quando solidifica) para o transformar novamente em
água. Um cristal polícromo de Bismuto. É este calor de fusão que
explica a estabilidade dos cristais e a tendência das substâncias
puras, quando arrefecem, para assumir a forma cristalina (com elevada
ordenação espacial).
Os materiais que quando solidificam não
libertam um calor de fusão, como acontece com a solidificação de um
vidro, apesar de em geral serem considerados sólidos, são, do ponto de
vista termodinâmico, líquidos com viscosidade quase infinita, já que as
suas partículas não atingiram um estado de mínimo energético. Outra
forma comum de cristalização, e a mais frequente em geologia, já que
está presente nos magmas e nas soluções hidrotermais, é a precipitação
a partir de uma solução. Um exemplo comum é o que acontece com as
soluções sobressaturadas de sal comum (cloreto de sódio): quando a
quantidade de sal em solução excede a que pode ser mantida àquela
temperatura, os iões de Sódio e Potássio começam a agregar-se de forma
estruturada (em geral em torno de impurezas ou de um cristal semente),
crescendo rapidamente por remoção de sal da solução. O mesmo acontece
com a formação dos cristais no magma: a partir do material fundido vão
sendo precipitados cristais que crescem por agregação dos átomos que os
constituem. Embora menos comum, mas de forma alguma rara, é a formação
de cristais a partir de um gás ou mistura gasosa.
O exemplo mais
comum é o crescimento dos cristais de neve na atmosfera por
ressublimação, ou sublimação regressiva, ao ocorrer a passagem de vapor
de água (um gás) directamente para sólido. O mesmo acontece com a
formação de cristais de enxofre nas sulfataras e de outros cristais em
torno das fumarolas. Um policristal de quartzo, uma das substâncias
cristalinas mais comuns na Terra. Em condições ideais, o resultado dos
processos de cristalização seria a formação de um único cristal, no
qual todos os átomos (ou moléculas) encontrassem o seu lugar numa malha
cristalina comum. Na realidade, porque o processo se inicia em
múltiplos lugares e é instável no seu desenvolvimento, forma-se em
geral uma miríade de cristais que se vão fundindo (com as óbvias
imperfeições daí resultantes), à medida que as suas superfícies de
crescimento se interceptam.
Os sólidos policristalinos assim
formados, apesar de localmente manterem a simetria imposta pela malha
cristalina, assumem formas complexas onde a simetria geral pode não ser
imediatamente perceptível ou mesmo não existir. Através de processos de
deposição controlada, é possível crescer grandes monocristais, como por
exemplo os necessários para aplicações fotoeléctricas. Devido às suas
especiais propriedade (e beleza) são também criados cristais geminados,
resultado de um crescimento simétrico em torno de um eixo predefinido.
[editar] Forma dos cristais Na natureza encontram-se cristais de formas
muito diversificadas, dependentes da forma de arranjo das cargas
eléctricas nos átomos ou moléculas que formam o cristal e das condições
em que a cristalização se deu por exemplo a água, pode assumir
múltiplas formas cristalinas em função da forma como o cristal se
formou: a neve e um cubo de gelo são formas completamente distintas de
cristais de água, com estrutura diferenciada em função das condições de
cristalização.
Pelas razões atrás apontadas, a forma dos
cristais depende não só das características do material de que o
cristal é formado mas também das condições de formação (um caso extremo
é o Carbono: a altas pressões e temperaturas forma o diamante, a altas
temperaturas e baixas pressões forma grafite, substâncias que á
primeira vista nada têm em comum).
Propriedades dos cristais
Um
monocristal artificial de grandes dimensões crescido por Saint-Gobain
para o laser de de alta potência do Commissariat à l'Énergie Atomique.
Os cristais apresentam propriedade ópticas e eléctricas específicas
distintas das de quaisquer outros sólidos ou fluidos, o que os torna
extremamente úteis em aplicações electro-ópticas e electrónicas, as
quais dependem da sua estrutura, do tipo de ligações e das impurezas e
defeitos na malha cristalina de que eventualmente padeçam.
A
maior parte dos materiais apresenta defeitos na sua malha cristalina,
em geral resultantes da presenças de átomos ou moléculas de outras
substâncias ou de defeitos no posicionamento da malha durante a
cristalização. Estes defeitos conferem características particulares aos
cristais, estando na base de muitas tecnologias. São defeitos na malha
cristalina do Silício, induzidas, por exemplo, pela presença átomos de
Germânio ou Gálio, que permitem o aparecimento de semicondutores, a
base da actual tecnologia electrónica.
Os efeitos mais
conhecidos da estrutura cristalina são os piezoeléctricos, que estão na
base, entre outras coisas, dos relógios de quartzo e das balanças
electrónicas, os ferroeléctricos, utilizados em detectores diversos, o
efeito piroeléctrico, usado em detectores de calor, termómetros e
detectores de intrusão, e, acima de tudo, a formação de semicondutores,
os quais estão na base de toda a electrónica dos transístores e díodos
aos computadores.
Outras propriedades dos cristais estão a levar
à utilização tecnológica da supercondutividade a altas temperaturas e a
crescentes desenvolvimentos no campo da física da matéria condensada
que poderão abrir novas áreas tecnológicas. O comportamento óptico dos
cristais está na base do laser, do maser, das câmaras fotográficas e de
filmar digitais, dos díodos emissores de luz (LED’s) e de todos os
desenvolvimentos em matéria de fotoelectrónica que estão a revolucionar
o mundo tecnológico. O pleocroísmo exibido por muitos cristais abre
novas perspectivas em termos de óptica e da sua utilização em técnicas
analíticas.
Cristalografia
A
cristalografia é o ramo da ciência que estuda as propriedade dos
cristais, a sua formação e interacção com os factores físicos e
químicos, incluindo os ambientais. Os cristais, devido às simetrias
geradas pela repetição espacial da sua estrutura atómica, assumem
formas geométricas bem definidas que estão na base da sua
classificação: em função do número de cadeias, dos eixos de simetria e
do número e características morfológicas das faces, são agrupados em
sistemas de classificação que servem para os identificar. Para uma
descrição destas formas de classificação veja o artigo: Estrutura
cristalina.
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Cristal